Tricotilomania: compulsão por arrancar fios do cabelo

Tricotilomania: compulsão por arrancar fios do cabelo

Este texto trata de um estudo sobre o hábito de arrancar os cabelos. Segundo o DSM-IV-TR, a Tricotilomania (312.39) pertence à Classificação dos Transtornos Mentais por descontrole dos impulsos, como um tipo de ansiedade (CID-10 F63.3).

A tricotilomania tem como característica essencial o arrancamento recorrente do cabelo de qualquer região do corpo, onde o mesmo cresça (cabeça, sombrancelhas, cílios, barba, região púbica e anal). Nos locais onde os pêlos são arrancados surgem alopécia, presença de folículos normais, porém lesionados e enrrugados, cabelos curtos e fracos.

Circunstâncias provocadoras de estresse, ou mesmo de extremo relaxamento e distração aumentam o comportamento. Antes de arrancar o cabelo o indivíduo sente uma sensação de crescente tensão, que alivia-se a medida que inicia o comportamento de arrancar os pelos e, subsequentemente, diminui a intenção de resistir ao ato, podendo ou não haver arrependimento, auto-recriminação ou culpa. Há uma gratificação ou bem estar, apesar de ao mesmo tempo, provocar um significativo deterioramento da atividade social, profissional ou outras áreas importantes de atividade do indivíduo.

Acompanha esse diagnóstico, um ritual em que a pessoa afaga os cabelos por algum tempo, escolhe um fio aleatoriamente, mas que não parece bem ao tato por alguma razão, então o arranca e depois o joga fora, ou em alguns casos, o ingere. As atividades de examinar frequentemente a raiz do cabelo, retorcer os fios, fazer tranças ou cachos continuamente, manter o cabelo na boca ou passá-lo nos dentes muitas vezes culmina na tricofagia, que significa comer cabelos. A ingestão de pelos pode causar anemia, dor abdominal, náuseas, vômitos, obstrução intestinal e ainda possível perfuração do intestino. Outros sujeitos arrancam cabelos de outras pessoas (quando têm oportunidade), de animais ou materiais fibrosos. Podem ainda fazer escoriações no próprio corpo, apertar e arrancar acnes no rosto, roer as unhas e arranhar-se.

Essas pessoas negam o comportamento, ocultando-o ou camuflando a alopécia, resultado do arrancamento do cabelo. A frequência do comportamento em homens e mulheres é igualmente representada, porém na nossa cultura os homens disfarçam mais o comportamento aparando ou depilando a região.

A psicologia postula que o comportamento impulsivo presente na tricotilomania relaciona-se a uma fraqueza do superego e das estruturas egóicas com fixação ao estágio oral do desenvolvimento. Neste caso, a oralidade é exacerbada e muitas vezes a tricotilomania vem substituir hábitos de chupar dedos, roer unhas ou mastigar os cantos da boca. Também deve-se investigar, se na infância, ocorreu medo do abandono, trauma de separação por perdas não elaboradas, perturbações no ambiente familiar e outras possíveis causas. O sujeito, na sua infância pode ter vivenciado privações afetivas que lhe causaram ansiedade, sentimento de inferioridade, culpa, depressão e sofrimento. O sujeito passa a utilizar como alívio desses sentimentos o ato compulsivo de acariciar-se agressivamente, arrancando os cabelos, arranhando-se ou auto-mutilando.

Presença de violência doméstica, abuso de álcool, permissividade, promiscuidade e tendência de comportamentos antissociais na família também parecem estar associados.

O arrancar cabelos se manifesta, na maioria das vezes, completamente desligado de sentido. A pessoa não consegue produzir associações que a levaria a dar significado para aquele comportamento. É como que, arrancar os cabelos não possa se constituir em algo a ser dito ou pensado, mas a ser vivido ou atuado. É um ato alienante, que captura o sujeito no tempo e no espaço e na impossibilidade de falar.

Os sintomas podem ser circunstanciais, aparecer na infância ou adolescência, e desaparecerem como tempo. Porém há casos em que, devido a frequência ou aos danos causados ao indivíduo requerem tratamento medicamentoso e psicoterapêutico.

É interessante:

· Localizar os momentos e circunstâncias em que o comportamento é mais frequente (diante da televisão?, quando está em sala de aula?, quando está sozinho?, quando está no ônibus?, quando está ansioso?)

· Inicialmente, solicita-se que em momentos propícios ao comportamento (por exemplo, quando for assistir televisão se for esse o momento em que o comportamento mais ocorre), utilizar de um lenço, boné ou algo que impeça o indivíduo levar as mãos à região manuseada.

· Indicar execução de tarefas manuais que substituam o comportamento compulsivo (fazer tricô, artesanato, colagem, segurar uma bolinha de borracha, etc) durante os momentos em que o comportamento é mais frequente.

· Aos poucos, promover o aumento gradual da exposição do paciente a situações estressantes sem as alternativas paleativas acima citadas.

Nas terapias medicamentosas normalmente são utilizadas antidepressivos ou antipsicóticos atípicos. Dependendo do grau das lesões nas áreas afetadas pode-se analisar tratamento dermatológico, cosmético ou cirúrgico.

A tricotilomania é um transtorno multifatorial que requer envolvimento multidisciplinar, com acompanhamento psicológico, psiquiátrico e dermatológico para o sucesso terapêutico.

 

Referências bibliográficas:

APA (Amerrican Psychiatric Association) (1995). DSM IV.Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais 4a. edição. (D. Batista, Trad.) Porto Alegre: Artes Médicas.

KAPLAN e SADOCK Compêndido de Psiquiatria: Ciência do Comportamento e Psiquiatria Clínica. 9ª Ed, p. 1300-1302, 2009

Walsh KH, McDougle CJ. Trichotillomania. Presentation, etiology, diagnosis and therapy. Am J Clin Dermatol. 2001;2:327-33.

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